É desejo
histórico e preponderante de todos os cristãos, a salvação da alma. Falo, a
princípio, de uma salvação em três níveis. O primeiro refere-se a manter-se em
hegemonia existencial no mundo presente, com dons paranormais, bênçãos
especiais, prosperidades metafísicas e contato com o Criador. O segundo nível e
mais estritamente simbólico, leva os cristãos a antever o episódio faraônico do
Apocalipse, visto que neste clímax derradeiro, a salvação consiste em não
participar dos ocorridos. E o terceiro e último patamar desta aventura
transcendental, se dará com o triunfo categórico sobre a morte, em que a vida
eterna se tornará uma realidade a todos os veteranos sobreviventes, não sendo
mais uma utopia mística, religiosa ou de cunho cultural.
Há,
entretanto, na aparência coletiva do cristianismo atual, uma idiossincrasia
negativa do ponto de vista soteriológico. Parece-me, quando ouço os púlpitos
evangélicos, que Jesus é uma espécie de Rei Midas ou alquimista medieval, que
possuía como plano essencial de Messias, trazer-nos, assim como equivocadamente
levaram a Ele, o ouro, a mirra e o incenso. Talvez fosse melhor que os magos só
levassem até o Salvador naquela manjedoura, orações, clamores, adoração,
misericórdias, louvor, humilhação e culto – nada tangível. Cristo não veio nos doar
a pedra filosofal ou o elixir da imortalidade para que tenhamos sucesso e êxito
em existência consciente. Seu desejo histórico e preponderante é que tenhamos
amor – só amor – para com Ele, seu Pai e nossos semelhantes. O amor é mais
pesado que o céu.
O amor é
que deve ser o nosso primeiro horizonte. A salvação nada mais é que apenas a
reação maior do amor que foi imolado antes da fundação do mundo. A salvação é o
efeito e não a causa; ela é a consequência final e presente da prática, crença,
devoção e de vida em amor. Salvar é o ato de um Deus que é amor antes de ser
salvador. Na verdade, o amor é que nos salva. Somos salvos de “não sermos
amados.” O amor é que agiu em Deus para que Ele criasse “alguma coisa” para
amar. O amor – afirmo em insignificância – talvez seja a única criação de Deus a
qual Ele mesmo tem prazer em se submeter. Porém, o amor é mais que simplesmente
uma criatura abstrata. Provavelmente ele é, de fato, a coexistência inevitável
do criador, que sendo amor, só pode ser Deus quando ama.
Este é “o”
(e não “um”) caminho sobremodo excelente. Não há outro. Pois se não tiver amor,
pode-se falar as línguas do céu, que de nada valerá; pois se não tiver amor,
poderá haver profecias, mistérios e poderes, e ninguém nada será; pois se não
tiver amor, ainda que haja obras, sacrifícios e total entrega, nada disso será
aproveitado (1Co 13:1-3). O amor pesa mais que o culto hipócrita oferecido
pelos “salvos” (Is 1:10-17). E, portanto, o Deus-Amor nos repreende: “Aprendei
a fazer o bem; atendei à justiça, repreendei ao opressor; defendei o direito do
órfão, pleiteai a causa das viúvas.” Não busque a salvação. Busque amar tudo
aquilo que pode ser amado. Tudo começa aí. Repare que o ladrão na cruz ama a Jesus
primeiro ali, para que depois ele seja salvo através da declaração pessoal e
direta do Cristo.
Contudo,
ainda parece-me que os cristãos são, por natureza religiosa, seres pragmáticos,
que desejam, sobretudo, serem salvos da ira de Deus sobre este mundo tenebroso.
Aparentemente, para eles, não há nada além disto. Neste tipo de “crentes”, existe
somente o desejo mórbido de descer no bote salva-vidas, sem olhar para o navio social,
político, econômico e espiritual que afunda ao seu redor. Vê-se a Igreja
Ocidental à espera de um arrebatamento iminente, sem se preocupar com as
crianças na África, os conflitos do Oriente Médio e com os sem-teto de suas cidades.
Mas será que o prêmio da soberana vocação é mais importante que a própria
vocação? (Fp 3:14). E que vocação seria esta? A de um dom ou chamado específico
ou a vocação de existir em amor? Afirmo, sem sombra de dúvidas, que Paulo fala
da última opção. E digo a todos: nenhum evangélico será salvo, se não tiver
amor. Portanto, que o amor invada a todos e faça de todos, amantes uns dos
outros e do Deus que é, está, cria, vive e reina em amor.
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