Entre Joios e Trigos

Servir ou ser visto é a maior confusão dos crentes na Igreja do novo milênio. Não se consegue mais compreender o paradoxo de Jesus, que diz ser o maior, aquele que se dispõe a servir. Lavar os pés uns dos outros com o melhor perfume, não perfuma mais os nossos interesses. A igreja se tornou um orfanato de irmãos desconhecidos, reunidos por uma fraternidade egoísta.

Servir implica em um relacionamento de humildade, de um auto-posicionamento abaixo, e simultaneamente, acima de quem é servido, objetivando suprir necessidades, firmar certezas e alimentar a fé alheia, pois assim como os braços não andam e os pés não pegam, todos os membros do corpo de Cristo também são interdependentes. Ser visto é uma prática de individualização espiritual, de um membro que quer auto-existir fora do corpo, que pretende se edificar, se engrandecer, e ter comunhão apenas com os títulos, ministérios, cargos, mídias, e demais fontes de êxito social perante o mundo evangélico.

A maior diferença entre o Joio e o Trigo consiste nesta disparidade. Paulo não havia lido o Livro da Vida, mas através de frutos de serviço, acabou por concluir que os nomes de seus companheiros e colaboradores, lá estavam escritos (Fp 4:3). João não elegeu nenhuma Igreja para a salvação, porém diante da mesma conclusão de Paulo, declarou eleita a destinatária de sua segunda carta (2 Jo 1:1,13; 3 Jo 9). Não há outro elo ou sinal na plantação que nos faça discriminar estes dois elementos, a não ser o produto de suas práticas e convicções em relação aos outros.
 
Quando falamos em outros, nos referimos principalmente aos da família da fé (Gl 6:10), mas de forma alguma, podemos excluir do rol de nossos atos de piedade, os que ainda não fazem parte deste escopo. Detesto ouvir o discurso aparentemente intelectual de cristãos que se dizem socializados, e que portanto, não dão esmolas e nem ajudam física ou economicamente moradores de rua, “indigentes” e pobres em geral, com a desculpa desumana de que se assim procederem, irão inibir a livre iniciativa de trabalho ou contribuir com a manutenção de realidades criminosas. Sugiro a estes sociólogos da Igreja, que se candidatem à Presidência da República, que sejam eleitos e que mudem todo o sistema. Mas enquanto isto não acontece, o que existe é o pobre, e Jesus não disse que este precisa de avaliação sociológica, mas sim de tratamento, doação e misericórdia. (Mt 25: 35-40)
 
Não estou argumentando em favor de uma alienação cega, no sentido de que não se deve avaliar os receptores de tais “esmolas”, mas sim em detrimento de um justo serviço a quem precisa de roupas para vestir e de alimentos para existir. Isto é, em última instância, a essência da Missão Integral. No entanto, este tipo de pensamento "socializado" não é o pior, pois existem alguns crentes que não entendem, mas até atendem ao princípio de se doar, e conseguem, mesmo que em colapsos momentâneos, servir como o bom Samaritano. A diferença é, que posteriormente a este ato, há sempre um sensacionalismo estratégico da parte destes "servos", que tocam trombetas e pedem aplausos a si mesmos, fazendo com que suas obrigações se tornem um favor, e com que suas ações se tornem fotos, vídeos e propagandas de vida com Deus. Isto gera consequentemente uma invalidação antagônica do valor do serviço realizado, caracterizando mais uma vez, a postura de um Joio.
 
Nenhuma árvore produz frutos para si mesma, e muito menos a sua sombra é para o seu próprio descanso. Jesus quer que, sobretudo, comunguemos erros e desgraças; quer que sejamos um corpo, onde a boca assopra a ferida do braço, e onde a mão massageia as dores da perna. Não há corpo sem este comportamento de auto-estima. Ter dons espirituais é ter para os outros; é ter a posse, mas não o direito; é ter a causa, mas não o efeito. As boas obras e não só as obras, simbolizam a existência de uma boa árvore. As boas árvores e não só as árvores, produzem frutos dignos de sua essência. Colher o Trigo e queimar o Joio não é tarefa nossa, mas conhecê-los e discriminá-los é o mínimo para sermos ou não irmãos.

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